Porto, 28 de Julho de 2012
Não é que me lembre, mas quando as férias eram largas e simples como um tapete largo e simples, como uma mesa larga e simples, havia quem, nas mais diversas latitudes, gastasse as horas mortas do Verão a escrever postais ou cartas, um hábito dos bons que se foi perdendo, com graves danos para a saúde da nossa caligrafia e para a reconstrução futura da memória que interessa e de que hoje não cuidamos, atarefados na partilha pouco parcimoniosa de fotos bizarras e de vídeos de gatinhos com tudo e gatonas sem nada. Muitas vezes, porque o mundo é vasto e os CTT não eram mais rápidos que a sua própria sombra de três letras, a missiva só chegava à caixa de correio uns dias depois da pessoa-remetente regressar à casa de partida e após ter ido beber um café ou uma groselha com a pessoa-destinatário, ocasião não raras vezes aproveitada, pela primeira, para relatar as suas aventuras no estrangeiro ou no Portugal marítimo, abusando nos detalhes e exibindo as 36 fotografias que comprovavam parcialmente o testemunho. Esse fenómeno de desfasamento temporal era quase sempre comemorado com um telefonema da pessoa-destinatário à pessoa-remetente, em que a pessoa-destinatário, depois de abreviar a conversa com um dos progenitores da pessoa-remetente, exclamava: "Olha, chegou hoje o teu postal!" Por incrível que pareça, nada disto entristecia quem quer que fosse. "Ah, chegou hoje? Está bem." Não era mentira nenhuma. Regra geral, aquilo estava mesmo bem. Éramos todos belos e bonitos. E feios, muito feios.
(boas férias)
(boas férias)