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≡≡≡≡≡≡≡≡≡≡ 31.8.10

Solomon Burke

Apreciemos a nova sabedoria dos antigos.

≡≡≡≡≡≡≡≡≡≡ 29.8.10

Kremšnita

De todos os países onde nada se passa, a Eslovénia é talvez o meu preferido. Com cerca de um quinto da área de Portugal, a Eslovénia alberga, preguiçosamente, apenas um exemplar de cada elemento: uma grande montanha (Triglav), uma cidade semi-cosmopolita (Ljubljana), uma praia (o que sobra da costa da Croácia), um intelectual famoso (Žižek) e um jogador de futebol (Zlatko Zahovič). Mesmo para um país jovem, esta não será uma lista que impressione por aí além, mas alto e pára o baile, que as contas fazem-se no fim e ainda agora começámos. Enquanto muitos dos idiomas indo-europeus preservaram pelo menos três formas para o género (normalmente juntando o neutro ao feminino e masculino), quase nenhum utiliza, actualmente, mais do que duas flexões gramaticais para o número. Regra geral, nas línguas vivas, estamos confinados ao plural e ao singular. O esloveno, contudo, é um dos poucos idiomas que tem três formas para o número, pois para além do singular e do plural, existe o dual (como no grego antigo, julgo eu). Estas duas últimas distinguem-se uma da outra porque enquanto o plural se utiliza para um grupo alargado de objectos ou pessoas (pelo menos três, e todos sabemos que três pessoas é quase sempre uma multidão), o dual fica reservado apenas para dois objectos ou duas pessoas. O esloveno oferece-nos assim, sem artifícios, uma ferramenta gramatical capaz de separar, com clareza, o que se refere ao par (sublinhando, consoante o contexto, a escassez ou a intimidade) daquilo que é característica de muitos (dando ênfase à abundância ou à dispersão). Isto não é útil? Claro que é útil. Numa época em que se glorifica a simplificação da gramática para estimular e facilitar a comunicação entre as pessoas tão atarefadas do nosso século, o esloveno mostra-nos que, por vezes, dotar a linguagem de alguma complexidade pode facilitar-nos a vida. A vida difícil, em grupo ou a dois.

≡≡≡≡≡≡≡≡≡≡ 27.8.10

Carta

(...) parece-me assim evidente que ou vossa excelência meu amor não sabe ler, ou eu não recebi, do céu e da terra, nem uma gota de talento para me fazer transportar, até si, pelas artes venenosas da escrita; mas vamos afastar, por enquanto, esta última hipótese (...)

≡≡≡≡≡≡≡≡≡≡ 24.8.10

Independança

Não tendo especial simpatia pelos movimentos independentistas, devo reconhecer, depois de algumas incursões pela Irlanda, Catalunha, País Basco e Galiza, que o esforço diário e guerreiro para preservar a língua, a música, os hábitos, a comida e vários etceteras, confere, a essas regiões insubmissas, uma vitalidade capaz de as proteger de certas tentações uniformizadoras deste nosso tempo, muito mais permeável aos encantos da moda do que à mecânica do progresso. Nada disto significa – deus me livre - que eu esteja pronto para viajar numa qualquer carrinha anti-globalização ou para me reunir em caves com fanáticos encapuçados. Julgo apenas que, do ponto de vista político, a estratégia ideal (neste caso, «ideal» significa «aquela que me deixaria mais contentinho») passa por simular, nalguns momentos com exagerado espalhafato, um conflito entre o poder central e as regiões desavindas, de modo a que os fiddles movidos a Guinness, o gaélico, os pintxos bascos, as vitualhas galegas e o Futebol Clube extremamente Barcelona possam existir como elementos de uma cultura viva e não como reminiscências saudosistas de uns quantos malucos apegados à tradição. No fundo, depois de mergulharmos a sério neste meu plano, o que importa é que a luta pela independência de cada um desses pedaços de território seja uma farsa útil, uma encenação com um ou outro episódio mais apimentado, um jogo algo infantil mas necessário para que pouco se perca e quase nada do que é bom se transforme, ao mesmo tempo que o pé indiscutivelmente catalão de Iniesta vai empurrando a grande Espanha para a glória.
@daniel
© daniel